Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

POEMAS E RECADOS

poemas e textos editados e inéditos de JOÃO LUÍS DIAS

POEMAS E RECADOS

poemas e textos editados e inéditos de JOÃO LUÍS DIAS

In nomine

 

Dei comigo 

ao vidro baço e lento da janela 
no palpebrar cadente e moreno 
dos teus olhos. 
A noite é apenas noite 
e o silêncio mudo 
e apenas se ouve o sussurro 
dos versos que te chamam… 
em nome de tudo 
e de todos os que ainda amam. 
E o sorriso foi dormir antes de mim 
querendo-me a cama morna. 
Se ausente te sei 
mesmo que só um pouco 
todo eu parto de mim 
para regressar-te nos meus braços 
louco
até que acorde de tudo o que sonhei 
nos beijos esquivos que me chamam 
e me sinta poeta do sentir… 
eu que nada sei 
em nome de tudo e todos 
os que ainda amam

João Luís Dias/Pedro Barroso

 

a integrar o repertório de Pedro Barroso

    - a sair brevemente em CD -

 

 

 

(Pedro Barroso e João Luís Dias)

 

TATUADA NO VENTRE

 

Na areia molhada, na praia vazia, vai gravando o som do mar a cada onda que se lhe quebra por perto e se desfaz em espuma branca a seus pés. 

É Outono, ausente de azul, cinzento, fim da manhã e Sheila insiste em permanecer ali, sem pressa e sem razão para a ter. Ninguém espera por ela e ela nunca esperou por ninguém. Está ali, ela apenas, despreocupada, sem relógio no pulso, sem relógios no céu. Está ali, só, e quer ficar assim naquela praia deserta, pisando a areia fria, olhando e gravando as ondas e o mar. Descalça, de calças içadas aos joelhos, sente o fresco no corpo, mantendo a febre no peito. 
Levantou-se cedo, madrugada ainda, seguiu a estrada do Oeste e escolheu aquele lugar para acordar de si naquele dia. E, aquele dia, naquela manhã desprovida de azul e de sol, é tudo o que quer para si. Sheila quer sempre pouco, do pouco que aprendeu a querer e lhe souberam dar.
De flor tatuada, em dias que o tempo engoliu as horas, quando achada perdida, Sheila insiste em querer encontrar-se, como se a coragem a pedir-lhe. Obrigaram-na, feriram-lhe o ventre, abafaram-na, profanaram-na e ela nunca soube aprender a fugir e esconder-se. Guarda memórias, disfarça mágoas, sente a dor a cada adormecer e ainda não rasgou folha alguma do diário que lhe relatam momentos; poucos de silêncio e conforto, muitos de grito e cólera. 
Passados tantos anos, tantas noites silenciadas entre paredes sem cor, esta mulher, feita mulher sem tempo há tanto tempo, criança ainda, sabe hoje, muito bem, de cada gesto que a não deixou adormecer, de cada dor que expulsou num grito, de cada momento que a não deixou crescer criança, brincar como criança. Sheila sabe bem de todas as palavras e de todos os nomes e de todas os momentos que o seu diário guarda e que tem nas mãos, ali, na praia vazia, de areia fria, de onde vai olhando e gravando as ondas e o mar. 
Passa já do meio dia e a neblina começa a levantar na praia e na praia fica apenas o cinzento, o frio, gaivotas soltas ao longe e ela e uma vontade enorme de soltar das mãos o diário que segura. Sabe bem o que diz ele. Sabe muito bem tudo o que dela está nele, e pesa-lhe agora mais que demais! 
De calças içadas aos joelhos, caminha pela areia fria até à água, às ondas, ao mar todo e solta nele o pedaço maior de si...

(Assim se inicia um romance. O resto o mar mo ditará...)


GRÉCIA

 

NÃO PERMITAMOS QUE SE CONTINUE A HUMILHAR A GRÉCIA.

A SUA HISTÓRIA VALE MUITO MAIS QUE QUALQUER DÍVIDA.

COMO A VAMOS LER E OLHAR NO FUTURO?

E SE PENSASSEMOS NISSO?!

 

 

IMAGINA?!...

 

 

 

DE CÚ NO MOCHO*

 

Manuel Casco, residente em Almeirim, distrito de Santarém, viu o seu julgamento adiado por indisposição do juiz. Terá de esperar mais alguns meses para conhecer o veredicto que o sentenciará pela infracção ao Código da Estrada.
Manuel Casco, residente em Almeirim, angustiado, teme pelo desfecho do processo que, pela primeira vez, o arrastou ao tribunal. Manuel Casco, de tanta ansiedade e medo, já vai tendo dificuldade em franquear o orifício que lhe permita libertar um feijão-frade que resista à tritura do aparelho digestivo. O Casco de Almeirim, assim conhecido na lezíria ribatejana, anda borradinho de medo.
Manuel Casco, apesar do gosto por quadrúpedes, nunca foi campino e jamais montou um cavalo puro-sangue da Alta Escola Equestre Escalabitana. Tem uma mula que há muito comprou da feira da Golegã e uma carroça com quatro rodas forradas de pneu que herdou do pai, finado vai já para trinta anos.
Mas Manuel Casco não está sozinho neste momento que tanto o vem angustiando; muitos amigos estão com ele e prometem mesmo jurar em tribunal pelo seu comportamento irrepreensível, evocando ainda a grandiosidade do seu coração. Manuel Casco tem em sua defesa muitos amigos, pois sempre soube fazer por eles.
Um dia, em Almeirim, bem no centro da povoação, Manuel Casco conduzia a sua carroça com rodas forradas de pneu, puxada a custo pela sua já velha mula. O sol era de tal forma abrasador que o calor já lhes gretava a boca de tanta sede sentirem. Manuel Casco, ansioso por chegar a casa, resolveu dar gás ao seu veículo de tracção às quatro, exigindo ao animal um último esforço, que certamente compensaria à chegada com um balde de água fresca e uma boa dose de sêmea de trigo. Para si, Manuel Casco, porque a água o deixa indisposto, tinha o vinho madurinho do Ribatejo à espera na tasca onde é freguês habitual.
Ao chegar ao cruzamento e ao acender o sinal vermelho a mula espantou-se com o reflexo e embateu de raspão num automóvel que passava. Chamada a polícia para tomar conta da ocorrência, esta quis verificar o nível de alcoolémia no sangue dos condutores. Manuel Casco jurou a pés juntos que depois do almoço nem uma pinga tinha bebido, mas a autoridade, não prescindindo de realização do teste, verificou que este acusava mais de duas miligramas de álcool no sangue.
O Manuel Casco, condutor de veículo de tracção animal, nem queria acreditar que aquilo lhe estava a acontecer. Jamais pensou um dia soprar ao balão com a mula ao lado a rir dele e ainda ter de sentar o cú no mocho*


* Arguido em sessão de julgamento

 

ENCONTRO DE POETAS Gerês 2011 (video)

 

Bem, enquanto presidente da CALIDUM - Clube de Autores Minhoto/Galaicos, parceiro na organização do Encontro, congratulo-me com o sucesso de mais este Encontro, onde a voz dos poetas chegou, quando tantos nunca as quiseram ouvir...

Enquanto autor, sinto-me honrado por ter estado entre uma família de almas enormes!

Às autoras das fotos e da formatação a minha vénia e agradecimentos.

 

João Luís Dias

 


Porque não

 

 

Não me cubro do sol

se me brilha demais e não me queima

Não me resguardo da chuva

se pingo a pingo me amolece o caminho

Não me escondo do vento

se em sopros brandos

me planta flores pelos beirais…

Não me derrubo às pedras soltas

de arestas limadas ou pontiagudas

se me convenci que era fácil demais!...

 

inédito

  

XI ENCONTRO NACIONAL DE POETAS

 

 

Com uma participação de autores que ultrapassou as duas centenas, vindos de todas as regiões do país, aconteceu uma vez mais na Vila do Gerês - concelho de Terras de Bouro, o XI Encontro Nacional de Poetas - 2011.

Surpreendeu mesmo a organização - Jornal Poetas & Trovadores, Calidum - Clube de Autores Minhoto/Galaicos e Município de Terras de Bouro, o elevado números de participantes, ao ponto do anfiteatro do Centro de Animação Termal ser pequeno demais para acolher todos os autores/poetas presentes.

 

Algumas fotos do encontro

 

(vista geral dos participantes (foto de família)

 

Barroso da Fonte, Joaquim Viana (presidente do Município), João Luís Dias e Manuel Afonso, atentos a um momento de declamação

 

(Manuel Afonso canta poema de João Luís Dias, a seu lado) 

  

(premiados no concurso de quadas aluzivas ao Gerês da edição 2011) 

 

Tango

 

Olho o pinhal pela copa da rama
e ao fundo o mar...
Quer um, quer outro
me parecem inquietos.
E sopra-me uma vontade enorme
de rumar ao sul
de dançar um tango
e sentir o teu cheio
a saciar-me nesta noite.
E ouço a melodia
e fervem-me as veias.
Transpiro e arrepio
e morro mil vezes de desejo.
E tenho o chão
ladrilhado de pétalas que te quero 
e não te tenho aqui!

 

 

in Coração de Algodão

 

Partilha

 

Empresta-me o olhar

e pela pele do rosto

deixa verter uma gota

do sorriso claro e calmo

e da boca…

bem, da boca

que se agita

tremente aos lábios

sente a naufragar o desejo

ao beijo esquivo

que se quer temperado

na água morna que encharca

e se reparte...

 

 

inédito 

 

 

ENCONTRO NACIONAL DE POETAS 2011

 

A estância termal da Vila do Gerês - concelho de Terras de Bouro, recebe a 17 de Setembro, sábado, pelas 10 horas, mais uma edição do Encontro Nacional de Poetas que contará com escritores que queiram trocar experiências, dando a conhecer as suas vidas e as suas obras.

Com inscrição gratuita, este encontro vai já na sua XI edição e serve como um espaço de debate e troca de ideias acerca do estado da poesia em Portugal. Aí, os autores convivem, mas também apresentam muitas das suas angústias, em virtude de nem sempre encontrarem quem os apoie no campo editorial – uma situação agravada pela actual crise económico-financeira do país.

O Encontro é organizado pela associação Clube de Poetas e Autores Minhoto-Galaico - CALIDUM – uma entidade com sede em Terras de Bouro e que tem desenvolvido grande actividade cultural, nomeadamente no apoio a edições de livros de autores locais – e pelo 'Jornal Poetas & Trovadores', responsável por um intenso trabalho no campo da divulgação de autores de todo o país.

Aos poetas que ao Gerês se deslocarem apenas é pedido que, de preferência, tragam um poema inédito que sirva de carta de apresentação. “Tanto melhor se for a exaltar as belezas naturais desse recanto do Minho, onde o azul do céu, o verde da serra, os recortes geográficos dos penhascos que rodeiam a simpática vila termal, reflectir o belo e misterioso que a catedral da poesia geresiana oferece a todos”, adverte fonte da organização.

Os interessados só terão que dizer, até 10 de Setembro, os nomes de quem vai estar presente. Isto por causa do almoço que a Câmara de Terras do Bouro, não obstante a crise generalizada, vai oferecer, no próprio edifício, “para que todos possam conviver, trocar livros, endereços, cantarolar”, neste que é um dos maiores encontro de poetas do país e que, desde há nove anos consecutivos, ali marca presença “em nome da sagrada arte de fazer versos”.

in jornal Terras do Homem