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POEMAS E RECADOS

poemas e textos editados e inéditos de JOÃO LUÍS DIAS

POEMAS E RECADOS

poemas e textos editados e inéditos de JOÃO LUÍS DIAS

A SUSTENTÁVEL LEVEZA DO TOQUE

 

Hoje, mais do que nunca, há toque nas relações humanas:

 

Quando se toca no teclado dum computador ou telemóvel para se comunicar com alguém;

Quando toca o telefone ou o telemóvel e nele se toca para atender;

Quando toca o sinal sms para anunciar nova mensagem de alguém e se toca no aparelho para ler e imediatamente se toca para pela mesma via responder;

Quando se toca numa coisa ou noutra para se tocar no sentimento de alguém.

Bem, depois se não se tocar em mais nada, já tocou e se tocou em muita coisa.
No passado não acontecia tanto toque assim.
Presente maravilhoso, porque tão cheio de toques, tão envolvido por toques e tanta emoção  nos toques…

 

 

 

 

 

 

VILARINHO DA FURNA - breve recordação

 

 

- Não ficcionado -

(dedico ao Dr. Manuel Antunes)

Despedida da sua aldeia, partiu, inconformada, a outro rumo. Afundaram-lhe a casa num poço de água aprisionada. Afogaram-lhe a aldeia e toda uma vida, pela construção de uma albufeira.
Chamavam-lhe Maria do Geira ("Mariquinhas", num trato íntimo e considerado).
O seu sorriso e a alegria das suas gargalhadas, amoleciam a mais forte dor no coração de quem com ela convivia. "Ao meu lado, não quero ninguém triste", dizia.
A Mariquinhas, nasceu e viveu (até um dia), na aldeia de Vilarinho da Furna. Quando dela partiu, chorou pela serra que deixava órfã, pelos prados sepultados, pelas aves que entontecidas voavam sem saber onde poisar. Com ela partiram todos; todos inconsolados, com a garganta engasgada de impropérios!
Vilarinho da Furna, onde a justiça imperava, onde as leis feitas nela mediam o peso certo, onde a solidariedade se riscava a toda a hora nas gastas pedras das calçadas, jazia só, submersa num manto de água parada e fria. Calava-se um nobre exemplo de comunidade!...
Volvidos vários anos, a Mariquinhas, com o mesmo sorriso, mas com a idade agora a quebrar-lhe as gargalhadas, voltou à modista que sempre a vestiu com aprumo, mesmo depois de ter partido da sua aldeia natal.
O vestido de tecido fino e negro que agora encomendava a confeção, seria o que iria guardar para a sua “última viagem”. Estranhou por isso a modista dos constantes reparos e exigências que ela fazia aquando da prova: ora mais cintado aqui, ora mais descido ali, ora mais folgado acolá… A Mariquinhas mirava-se de todas as posições em frente ao espelho. Mereceu, por isso, o reparo:
- Porquê tão perfeita a confeção do vestido, se afinal é para levar para a cova?! – perguntou, curiosa, a modista.
- Porque na hora da minha partida quero continuar a manter o aprumo e brio, em nome do povo da minha terra, que sempre mereceu – respondeu.

 

 

AUSÊNCIA

 

 

Sem ti a respirar-me na boca
a transpirar-me no peito
a sussurrar-me ao ouvido coisas grandes do sentir…
não se secaram as fontes na paisagem
não se escondeu o relógio no céu
não se quebrou a linha no horizonte dos olhos…
mas aquelas vertem menos
aquele parece de ponteiros quebrados
e esta parece linha de fronteira nenhuma…
Porque sem ti…
tudo existe menos!