grávidos de aroma e candura um ventre em flor a abrir na primavera. Entontecido porque embriagado no campo limado e morno do entardecer falei-te e disse quase nada por não saber dizer mais do teu olhar. E volta de ti um poema um poema maior declamado em sussurro que me trespassa pelo peito como flecha acesa de licor e lume tombando-me ao crepúsculo dos teus olhos no salpicar imenso das palavras. E fico internado na metáfora enorme que teceste lá dentro!
Vestiu no rosto o sorriso e nunca mais o despiu. Aos olhos levou o sol e o calor ficou neles. Vive como se a vida não tenha lados sem luz como se as noites fossem todas de luar. E combate as cinzas dos dias sorrindo e acreditando... - Não vai ao chão toalha de pano fino!- Porque nasceu em agosto, aos primeiros dias a minha mana, Alice que as rendas a quiseram é mais do que o céu é mais do que o sol é mais do que um mar grande e do que o seu extenso areal; é um presente do verão!
Jantava no Shopping e no lapso de cinco minutos fui abordado duas vezes - primeiro por uma rapariga pálida e magra, depois por um rapaz alto, esguio e de cor igual no rosto - e ambos me pediram dinheiro para poder comer alguma coisa. Atento, verifiquei que a mais ninguém, das mesas do lado, fizeram o mesmo pedido. Claro que não lhes neguei e até fui franco na oferta. O filhote, a meu lado, observou: “Deves ter aspeto de rico, só a ti pediram dinheiro.” “Sou completamente igual a eles, com a diferença, apenas, de não ter a mesma cara de fome e sorte" - respondi.
Beberia das mesmas fontes de águas lavadas e de outras também. Cruzaria os mesmos caminhos alguns de pó, outros de pedra e muitos mais, longos, de asfalto que nunca soube onde chegavam. Olharia as mesmas montanhas o mesmo mar, as mesmas ondas à mesma hora, ou sem relógio. Amaria da mesma forma o que amei e quis amar sabendo-o bem, ou nem sabendo. Sentar-me-ia no mesmo lugar à espera do mesmo olhar do mesmo abraço, do mesmo cheiro sonhando sempre, mesmo acordado. Voltaria a procurar-me... a inventar-me… Isto, faria igual, do mesmo jeito o resto faria... sei lá... da mesma forma!
(Nota: outrora, onde agora se estende um alçado do prolongamento da Câmara do Município de Terras de Bouro (ladra do sol da minha rua), havia um terreiro com seis árvores gigantes de framboesas de várias cores).
Estavam sentados numa mesa, a três ou quatro metros de mim. Eu degustava um frango de caril e eles, de mãos dadas, bebiam dos olhares que trocavam, como se o amor lhes vertesse dos olhos. Era íntimo o espaço deles e era meu o resto do lugar. Eles sabiam disso, e eu nem dava por isso. Falaram, em sussurro, de coisas que eu não ouvi, mas, tenho a certeza, diziam de coisas grandes da vida deles. Eu bebi o último gole de vinho, e eles levantaram-se e entregaram-se num abraço. Claro, sentados a uma mesa, de frente um para outro, como se poderiam abraçar? Não ousaram no beijo, sabiam que o espaço deles eram apenas um canto do resto do lugar; e no resto do lugar todo estava eu. E para quê o beijo das bocas, se naquele abraço já se beijavam os corações?
Se um dia fosse senhor de qualquer coisa que fosse: de uma rua empedrada de três casas num caminho dum país despovoado duma serra abandonada dum lírio roxo sozinho não me queria acomodado conformado, envaidecido porque servo ou dono era do silêncio de prados despenteados do pó, das pedras e de pouco mais...