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POEMAS E RECADOS

poemas e textos editados e inéditos de JOÃO LUÍS DIAS

POEMAS E RECADOS

poemas e textos editados e inéditos de JOÃO LUÍS DIAS

DESGARRADA

 

 

Tudo começou assim, com um minhoto (Braga) e uma alfacinha (Lisboa)

 

(MJP): Olha eu a assobiar...

 

(JLD): Quem assobia, não canta
Diz-se e tem-se razão
Ou se canta ou se assobia
Há que fazer-se opção

 

(MJP): Eu assobio a cantar
Pelos vistos sou excepção
Também canto a 'ssobiar 
Não tenho que ter opção...

 

(JLD): És branda no assobio
Se cantas a´ssobiar
Ao cantar, abres a boca
Como poderás soprar?

 

(JLD): Anda lá, minha alfacinha
Destrava a língua a cantar
Ou tens força na garganta
Ou vai p´ró Tejo pescar

 

(MJP): O assobio é um canto
Um canto é um assobio
Sobe a ladeira do sopro
Desce no correr do rio...

 

(JLD): No meu rio só desce água
Os peixes não vão p’ró mar
Ou se canta ou se assobia
Nada vai, se quer ficar

 

(JLD): No Minho há desgarrada
Aprendi nas romarias
Se cantas não ´stás calada
Não espero as tuas rimas

 

(MJP): Canto o Fado e danço o Vira
Pesco no Tejo ao anzol 
Vai mas é molhar os pés
E apanhar banhos de sol...

 

(MJP): É bom que as não vás esperando
Que as minhas rimas têm dono
Contigo só desrimando
Em era uma vez um conto...

 

(JLD): Demos corda ao versejar
Continuemos então…
O fado não vou cantar
Mas pego peixes à mão

 

(MJP): Já estou mortinha de sono 
Vai então pescar p'ra mim 
Pode ser uma lampreia 
Antes que ela chegue ao fim...

 

(JLD): Não queres subir ao Castelo 
e ver se chove na Graça?
Aproveita, olha o Rossio 
E vê bem quem por lá passa

 

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João Luís Dias (JLD)

versus

Maria José Praça (MJP)

 

 

RUA QUARENTA

 

 

Gosto desse sorriso

que parece que não é.

Gosto do enigma

que guardas nos olhos.

Gosto de te procurar

nas ruas que não percorres.

Gosto de me encontrar por aí...

onde eu sei andar

contigo

devagar

sem relógio.

 

 

 

 

VERTIDOS

 

Entra. Fecha a porta.

Não, deixa-a entreaberta

para que a brisa nos espreite e sopre; será preciso...

Molha-me a boca, varre-me o ácido dos dias sem ti.
Enlaça-me, chama à tua a minha pele
cessa os meus momentos mornos de invernos impiedosos. 
Pára, não desabotoes a seda que me cobre o peito; 
rasga-a em tiras desalinhadas
quero-me como farrapo em teu corpo.
Abraça-me, suga-me, ferve-me 
salga-me o corpo no teu transpirar.
Arrasta-te à parede e volta-te para ela
quero partir contigo as fronteiras do desejo.
Levanta os braços, abre as mãos em palmas
e mancha de água a parede envergonhada.
Seguro-te e arrepias, solto-te os seios acesos
pego-te os pulsos e sinto o sangue a arder!
Rasgo-te, como rasgado estou em mim.
Afasto-te as coxas, vergo-te e beijo-te a nuca.
Sinto os pés no chão vertido. 
Vou para ti desnorteado, endoidecido…
e não quero, saber, sequer

se a porta se abriu completamente, ou se fechou.

 

 

DELÍRIO

 

 

Solta-me por ti

agora que o fogo me cercou
e as chamas me colheram
Deixa-me arder 
contigo
ateados de desejo
Então
perdido de mim 

refém só do teu corpo
sufocado e entontecido
destilarei 
no bálsamo perfumado 
do teu ventre

 

 

PEDRAS

 

Duma pedra

faço uma mulher.

Duma montanha de pedras

faço mil poemas.

Quando não tenho pedra alguma

invento-as no peito

e faço-me a mim.

Depois...

deixo-me ir no vento

como se cada pedra

fosse uma pena.

 

 

ROMARIA

 

Diz o Manel à Maria
Com prosa de engatatão:
- Nesta linda romaria
Da Senhora d´Agonia
Acendes-me o coração?

 

- Faz esse pedido à santa
Eu nunca fui milagreira
E caso a chama propaga
Rápido o fogo se apaga
Com água ali da torneira

 

romaria.jpg

 

 

 

 

PENSO EU

 

 

A toda a hora morre alguém. A toda a hora nasce alguém. A toda a hora alguém, privilegiado, se sente dono e senhor de mais uma hora.
Os mortais são peso e ponteiros para o equilíbrio das horas. 
E depois poderão ser, também, algumas coisas mais...