Há hora de nada
(Dedico à Prazeres, que me pegou no colo)
Da eira, a avenida pacata e quieta.
Nos pés, as meias de lã tricotados ao serão
depois do terço rezado em família pela hora do cear.
No corpo, a saia travada, costurada em pano de terylene,
quando aprendiz de modista nas horas que lhe sobraram…
No cabelo, farto, três ganchos seguram o "tornico"
enrolado pela manhã, no ritual dos dias madrugados.
Na varanda da farmácia do Barroso ninguém se debruça
ao cheiro das floreiras envaidecidas de rosas vermelhas
e ninguém espreita do pátio do Funileiro
o chegar da camioneta da carreira.
No táxi e no Fiat do Afonso Novo não entra nem sai ninguém.
As laranjeiras, de tronco esguio,
vão medrando ao calor dos dias sem pressa.
A Prazeres está só, e não se importa de olhar e de esperar...
E olha a gente que não passa.
E olha os carros que não passam.
E olha... como tudo lhe seja movimento;
como tudo esteja para chegar…
inédito