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POEMAS E RECADOS

poemas e textos editados e inéditos de JOÃO LUÍS DIAS

POEMAS E RECADOS

poemas e textos editados e inéditos de JOÃO LUÍS DIAS

MOSTRO

 

 

Mostro de mim quase nada
e nada já sou quem sou

Verto dos bolsos os versos
que guardo dos meus delírios
se me inventei ao luar…
nas noites mansas do estio

Guardo os sabores temperados
em favos de mel e sal
nas fendas no céu da boca
quando à sede me rendi

Mostro de mim quase nada
e nada já sou quem sou

Sei das cores das flores do campo
Sei das dores das folhas no outono
encharcadas de saudade
quando se vão sem querer…

Mostro as minhas mãos rasgadas
nas pedras ásperas que abracei
e guardo flores secas prensadas
dos jardins que não reguei…

Mostro de mim…

 

 

"TINO", A VOZ DOS AUTARCAS CALADOS

 

No decorrer do congresso do Partido Socialista, no Coliseu dos Recreios de Lisboa, a determinada altura subiu à tribuna, não para apresentar qualquer moção ou estratégia política ao partido, mas para “deitar faladura” e dizer de sua justiça, como qualquer outro congressista consagrado ali presente, uma figura no mínimo curiosa e, sem dúvida, diferente daquelas que todos os dias nos fustigam com palavreado e nos rebolam sedução, para na próxima recolha eleitoral contarem com o nosso precioso voto.

O congressista de quem quero falar poderá chamar-se Justino, Altino, Clementino, Florentino, Albertino, Vitorinho… Não sei. Sei que lhe chamam apenas “Tino”. O seu pai poderá ter o nome de António, Joaquim, ou qualquer outro. Também não consegui saber. Sei que a sua mãe se chama Gertrudes e teve direito a um beijo repenicado, que do alto do “falante” lhe enviou o seu afamado filho, através das câmaras de televisão e em direto. Também não sei se tem dois irmãos, ou mais. O único que o Tino mencionou chama-se Necas.
Bem, agora que o agregado familiar está, mais ou menos, apresentado, vamos falar da intervenção do jovem autarca.
O Tino, presidente da Junta de Freguesia de Rans, concelho de Penafiel e calceteiro de profissão, começou por, em breves palavras, contar como tudo aconteceu até à sua entrada na polícia e no poder:
O Necas, seu referido irmão, via nela a pessoa ideal para liderar aquela Junta de Freguesia, não só pelos seus dotes de orador, como também pela sua capacidade de liderar. Por isso o convenceu a candidatar-se ao cargo, apesar dos temores da mãe Gertrudes, que não via com bons olhos aquele salto qualitativo do filho.
A verdade é que tudo se conciliou; ele candidatou-se, a mãe conformou-se e ele venceu as eleições. Até parece fácil ser presidente de Junta! De seguida, o Tino afirmou que a partir daquele momento o nome da sua terra passaria, inevitavelmente, a constar do mapa de Portugal e, em discurso contínuo, afirmou ainda ser o orgulho da sua terra, o “cartaz” de todos os ransenses perante todo o país. Borrifou-se, literalmente, na modéstia. “Eu sou bom, o melhor e mais fortes da freguesia" e pronto. Depois, porque ele próprio disse que merecia, foi dar um abanado abraço ao secretário-geral do partido.
Para a sua oratória estavam destinados três minutos, mas como foi interrompida por oito minutos de palmas e gargalhas, permaneceu onze minutos naquele "altar de ilustres".
O Tino mais nada disse. Mais nada tinha para dizer.
Sempre assim será?!...

 

 

Nota:
Hoje, o "Tino" é o candidato ofical, Vitorino Silva, à Presidência da República